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Sim, eu vou à Copa do Mundo. Ao contrário da Carla que mora nos EUA
This blog is supposed to be English only, but there have been many requests for a translation of my post against the World Cup boycott. So here it is.
É compreensível que parte dos manifestantes tenha ido às ruas contra os gastos envolvendo a Copa do Mundo. E é importante que a mídia internacional tenha todas as informações antes de tratar desse assunto. A primeira questão é com o apoio nacional ao torneio que acontecerá em 2014. E eu digo isso como alguém que IRÁ ao Mundial, apesar de ter críticas sobre a condução do processo.
O vídeo da brasileira Carla Dauden é um dos exemplos da revolta da classe média que domina alguns protestos. Ela vê o Brasil com a famosa “síndrome do cachorro vira-lata”, como se o Brasil não merecesse assumir um papel maior em assuntos globais e deveria ser deixado no seu cantinho. A forma como Carla faz isso é basicamente política velha em fantasia de YouTube. Ela diz que deveremos transformar vitória e responsabilidade em derrota e negligência. Acho que é uma forma muito estúpida de fazer política. Assim como tomar todo o país por aquilo que ela diz não é muito esperto.
Até semanas atrás 77% dos brasileiros apoiavam a Copa do Mundo no Brasil, segundo o Datafolha. O mesmo instituto diz que 77% apoiavam os protestos contra o aumento das tarifas de transporte.
Apenas somando esses dois nota-se que a questão para muitos brasileiros não é receber ou não a Copa do Mundo. O fato de a Copa das Confederações dar algum holofote aos protestos não significa que a maioria dos brasileiros querem abrir mão dela. Não tenho dúvida de que o apoio diminuiu após as manifestações, mas 77% de apoio é um número que serve de referência para as análises.
Não há mérito em dizer que a rejeição é geral por causa de brasileiros ingênuos que vivem nos EUA e falam inglês bem. Ainda menos mérito quando isso é usado para sugerir que o Santo Graal do futebol deve ser levado a outro lugar, já que Carla e aqueles que a viram no YouTube supostamente preferem assim. É uma política de urubus encontrando-se com a política do não. Uma hora sai pela culatra.
A maioria, independentemente do impacto que os protestos venham a ter, não está nas ruas nesse país de quase 200 milhões de habitantes. E isso não está ao alcance de brasileiros que vivem nos EUA e fazem vídeos sobre mudar o Brasil boicotando a Copa do Mundo. Se essa é a proposta de mudança que eles oferecem, eu rejeito. Não me importa se 3 milhões de pessoas viram o vídeo.
Além disso, desistir da Copa custaria R$ 10 bilhões ao Brasil. O valor fala por si. Carla não pagará por isso com seu Boycott Express. Todos os gastos em estádios levam em conta receitas futuras. O que Carla sugere é que gastemos e abramos mão das receitas. É muita estupidez. Isso sem mencionar que ela confunde a ideia de ter melhor infraestrutura (dois terços dos R$ 30 bilhões esperados em gastos) com investir tudo em arenas. Está errada.
É claro que o Brasil precisa de melhorias na educação e na saúde. É claro que se gastou demais com a Copa do Mundo, e isso merece ser investigado. Mas a quantia investida no torneio é várias vezes menor do que a investida em saúde. Apenas neste ano o Brasil gastará R$ 100 bilhões na área.
Eu escrevi longamente sobre preparativos para o mundial, tanto para a revista FourFourTwo como para o meu projeto final no mestrado. Sei que o legado será menor que o esperado. Mas não gastar nem sempre é o melhor. Comparar a Copa no Brasil com a da Alemanha, onde tudo estava pronto, ou com a da África do Sul, onde pouco foi feito, é muito raso.
O Brasil ganhou o direito de receber o torneio em 2007 e houve consenso da naturalidade da candidatura. É verdade que isso não foi amplamente debatido na sociedade. Mas o processo raramente usa um referendo para se legitimar. O sistema de concessão da sede da Copa é feito em forma de rodízio e os sul-americanos concordaram com o Brasil como sede, assim como os africanos acordaram que seria a África do Sul em 2010.
A questão da Copa ganhou espaço porque os manifestantes queriam a atenção aumentada com a Copa das Confederações — com protestos perto dos estádios em todos os dias de jogos não há mais como negar. Antes de junho, a maior mobilização, que nem tinha tomado as ruas, foi para proibir a venda de bebidas alcóolicas nos estádios. Muitos eram contra a medida que viabiliza algo que Carla já faz nos estádios americanos. É claro que houve outras mobilizações e protestos antes dos atuais, mas o do álcool foi o que mais mexeu com os políticos.
Finalmente, é importante lembrar que protestos nunca foram motivo para mudar a sede da Copa do Mundo. Quando a Colômbia abriu mão de receber o torneio, em 1986, o problema foi basicamente financeiro, ampliado por um terremoto. Se boicotar fosse a solução, Pequim não deveria ter recebido os Jogos em 2008 e a Cidade do México, em 1968, após um massacre relacionado às competições um ano antes.
Quando a violência tomou conta do Reino Unido em 2011, poucos duvidaram do sucesso de Londres 2012. A China manifestou publicamente suas dúvidas sobre a segurança. Os próprios britânicos se questionaram. Mas o tom daqueles que queriam ser construtivos não tocavam as Olimpíadas. Foi aceito que os britânicos lidavam com uma revolta e que isso não escondia seus méritos. O Brasil não é diferente.
É fato que o Brasil ainda não está pronto para a Copa e precisa usar bem os próximos 12 meses. Mas democratas devem ser pacientes com democracias quando elas debatem seu futuro, e não abraçar radicais como se eles representassem a maioria. Radicais como os boicotadores que repetem a política do “não” como se fizessem o bem.
Não, eles não fazem. Eu acolho os críticos de gastos altos e fui um deles — em especial ao falar dos estádios de Brasília, Cuiabá e Manaus. Mas formar uma nação vem de debate, não da postura “deixe o problema para outra pessoa”. Especialmente quando essa postura vem de quem está a milhares de quilômetros do local onde supostamente querem fazer a diferença.